sábado, 28 de novembro de 2020

Em Ótima Partida, Leeds Vence Everton Com Gol Brasileiro

Chegamos à décima rodada no Campeonato Inglês - a mais forte liga de pontos corridos no futebol mundial - e tive o prazer de assistir nessa tarde a minha trigésima quarta partida na competição. Considerando que ano passado praticamente não assisti jogos da Premier League, até me surpreendo por estar com uma média de mais de três jogos por rodada. Talvez seja um dos efeitos colaterais positivos nessa pandemia.

Fato é que o jogo que acabei de acompanhar merecia uma postagem. Trata-se do encontro entre dois dos times que mais me dão gosto de ver atuar. Quem leu essa publicação aqui sobre Carlo Ancelotti e Marcelo Bielsa já sabe as razões

O Everton recebeu o Leeds na cidade de Liverpool e o que se viu foi, na melhor acepção do termo, uma partida de futebol. 

Carlo Ancelotti teve a ousadia de diminuir a linha de defesa e aumentar a quantidade de jogadores no meio de campo, mexendo bastante na escalação e na própria estrutura de jogo da equipe. O que se viu foi um Everton ofensivo, contando com atuações destacadas de seus brasileiros titulares: enquanto Allan dominava as ações protetivas à defesa, Richarlison se movimentava bastante no campo de ataque. Por duas vezes, o Everton foi à rede. Mas a arbitragem comandada por Chris Cavanagh (que recebeu ótimos auxílios nas marcações de impedimento) acertou ao anular os gols de James Rodríguez e de Richarlison, mantendo o placar zerado.

Aliás, justiça seja feita: o placar se manteve inalterado não somente pelas corretas invalidações dos gols. Tanto Pickford (sensacional ao salvar com o pé direito um remate de Bamford aos vinte minutos) quanto, principalmente, Meslier (que aos seis minutos foi espetacular ao intervir na finalização de Doucouré) realizaram ótimas defesas na etapa inicial. Teve também uma incrível intervenção de Godfrey - salvando o Everton praticamente sobre a linha final - e um cabeceio de Harrison que acertou a trave esquerda dos donos da casa. Enfim, um jogo muito movimentado e cheio de alternativas para ambos os lados.

Veio o segundo tempo e o ritmo se manteve frenético: logo nos minutos iniciais, uma chance clara para cada lado. Na marca de vinte minutos, Bamford completou para as redes, mas novamente a arbitragem auxiliar acertou ao marcar impedimento no lance - Alioski recebeu em posição adiantada antes de cruzar pra área. 

Aos poucos, os setores de meio campo ganharam solidez perante as investidas adversárias. Dessa forma, James começava a sumir da partida e Iwobi também pouco incomodava. Méritos para todo o sistema defensivo do Leeds, que tinha em Kalvin Philips um personagem central, ganhando praticamente todas as divididas e garantindo segurança à última linha.

Ancelotti buscou novos caminhos e colocou primeiro Delph no lugar de Davies e depois André Gomes no lugar de Iwobi. Enquanto isso, Marcelo Bielsa analisava o jogo do seu jeito característico - agachado no limite da área técnica. 

Aos trinta e três, brilhou a estrela do único brasileiro da equipe visitante: Raphinha recebeu de Harrison, arrumou para a perna canhota diante da marcação de Godfrey e chutou cruzado, de fora da área, sem dar qualquer chance para Pickford. A bola entrou no canto esquerdo e, na imagem frontal do lance, foi possível ver um capricho dos deuses: ela, a bola, rumou precisamente para onde havia uma bandeira do Brasil, estendida provavelmente pelos torcedores do Everton, ausentes das arquibancadas por motivos de distanciamento social. A bandeira homenageava Allan, Richarlison e Bernard (que entraria minutos depois). Mas, naquele momento, aquela flâmula representava o porto alegrense Raphinha, que com seu pé esquerdo marcou o único gol da partida.

Nos últimos instantes, Hélder Costa - que entrara no lugar de Harrison - quase ampliou, mas parou em excepcional intervenção de Pickford.

Nesse exato momento, o Everton se encontra na sexta posição, com dezesseis pontos e flertando com a zona da Liga dos Campeões da Europa. Já o Leeds, em décimo primeiro lugar com catorze pontos, conserva ótima margem de distância da zona de rebaixamento. E o mais importante: jogando, na minha opinião, o melhor futebol da competição.

Imagem obtida em Yorkshire Evening Post

domingo, 27 de setembro de 2020

Campeonato Inglês - Obrigado Pela Presença, Ancelotti E Bielsa!

Estamos na terceira rodada no Campeonato Inglês e até o momento assisti um total de quinze partidas - benditos sejam os serviços de streaming, não é mesmo? Se eu continuar nesse ritmo, até o final do ano estarei fluente no idioma árabe - por enquanto, sequer descobri o nome do canal, mas já o considero pacas.

Pensei em fazer uma publicação falando rapidamente sobre cada um dos quinze jogos que acompanhei. Ou então fazer um resumo sobre cada equipe que vi jogar. Mas achei mais interessante tomar outro caminho: vou abordar especificamente dois times - o Everton e o Leeds United. 

Há dois motivos preponderantes para essas escolhas: o primeiro, é que eu assisti todos os três jogos de cada um deles; o segundo, é pelo fato de ambas as equipes terem me encantado pela forma como atuam. Então, sem mais delongas, segue breve análise sobre as primeiras percepções que tive de Everton e Leeds.

Everton (vitórias por 1a0 sobre o Tottenham, 5a2 sobre o West Bromwich e 2a1 sobre o Crystal Palace).

Carlo Ancelotti chegou nessa temporada e já conseguiu dar um perfil altamente competitivo à equipe. Com algumas contratações interessantes que qualificaram o setor de meio de campo, os azuis da cidade de Liverpool apresentam uma forma de jogar altamente propositiva e com grande dinamismo entre os setores.

James Rodríguez encaixou perfeitamente no esquema de jogo - ou, talvez, o esquema de jogo é que se encaixou nele. O fato é que Ancelotti tem conseguido um desenho tático onde James possui grande participação. E o meia colombiano vem atendendo muito bem, se apresentando pro jogo, se movimentando bastante e trazendo para si a responsabilidade de ser o principal articulador das jogadas.

Mas o êxito de James nesses três jogos na Premier League se deve não apenas ao talento desse ótimo jogador: no sistema montando pelo técnico italiano, Doucouré, Allan e André Gomes trazem bastante consistência para a segunda linha. Tal consistência aumenta a proteção a uma defesa que vem sendo composta por Coleman, Mina, Keane e Digne - Pickford é o goleiro. E essa proteção permite a James uma dedicação que o torna praticamente um terceiro atacante. 

E por falar no ataque, é aí que está a grande atração desse time do Everton até o momento. O brasileiro Richarlison mostra-se fundamental nessa equipe. Ele consegue carregar a bola e impôr velocidade pelos flancos, além de se apresentar como excelente opção tanto para infiltração quanto para chutes de média distância. E, de quebra, o outro nome do setor ofensivo é Calvert-Lewin. Calvert quem? Pois é, eu não conhecia esse jogador. Para ser sincero, seu futebol não me convenceu. Mas esse camisa nove merece atenção: marcou gol em todas as três partidas, com direito a um hat-trick diante do West Brom. Bonito ou feio, todos os gols contam igualmente. E a vocação desse centroavante de cinco gols em três rodadas já está explícita: colocar a bola para dentro.

O Everton é um time a se acompanhar. Eu não me surpreenderei se eles pintarem na próxima Liga dos Campeões da Europa. Ao contrário: estou até botando fé que isso possa acontecer. Mas mais importante que tentar adivinhar o futuro do Everton é saborear o presente, pois a equipe de Ancelotti está dando gosto de ver jogar.

Foto: Alex Livesey/Getty Images

 

Leeds United (derrota por 4a3 para o Liverpool e vitórias por 4a3 sobre o Fulham e 1a0 sobre o Sheffield).

Eu sou suspeito para falar do Marcelo Bielsa. Admiro o trabalho desse técnico desde décadas atrás. E o fato é que, no Leeds, "El Loco" Bielsa está fazendo mais uma intervenção genial num time de futebol. Bom para o Leeds, que está de volta à primeira divisão inglesa, e bom para quem gosta desse esporte, por poder assistir uma equipe tão bem dirigida naquela que é a liga de pontos corridos mais forte do mundo.

Sem jogadores badalados no elenco, o time tem conseguido jogar de igual para igual com todos os adversários. E quem assistiu a partida de estréia, com o atual campeão Liverpool, sabe o quanto isso é verdadeiro: o Leeds buscou o empate três vezes, frequentou o campo de ataque mantendo a bola circulando, e somente saiu derrotado por uma infelicidade num pênalti cometido nos últimos minutos em Anfield Road.

O desenho tático mostrou algumas variações entre um jogo e outro: uma linha de defesa com Ayling, Koch, Struijk e o incansável Dallas; o combativo Phillips fazendo a proteção imediata; e uma outra linha mais à frente, onde merece destaque o talento do português Hélder Costa, que atua pelo flanco direito. Outros atletas que atuaram por aquela faixa do gramado foram Pablo Hernández (na partida de estréia), Klich (nos três jogos), Harrison (também nas três partidas) e Rodrigo (que é mais utilizado como atacante, mas que não costuma ser aproveitado nos noventa minutos). No ataque, a referência é Bamford, um camisa nove bastante interessante: ao mesmo tempo em que se movimenta pelos lados, consegue ser boa opção também no jogo aéreo. Não por acaso, marcou gol em todas as rodadas - às vezes fazendo dupla com Rodrigo, às vezes com Roberts, às vezes mais isolado, mas sempre eficiente.

Aliás, o termo "isolado" para o atacante Bamford é meramente ilustrativo. A equipe do Leeds se aproxima do seu goleador trazendo jogadores para tabelas e triangulações, conseguindo por muitas vezes impôr dificuldades nas defesas oponentes. Trata-se de uma intensidade de caráter filosófico, pois ocorre independentemente do contexto do resultado da partida. É essa a maneira de jogar do Leeds e ponto. Se há alguém "isolado" no Leeds, esse alguém é o goleiro Meslier - que, por sinal, fez duas defesas fabulosas na partida de hoje.

É muito difícil cravar que o Leeds possa se manter nessa divisão, pois se trata de um campeonato onde muitas equipes possuem grande capacidade de investimento e acabam dispondo de elencos tecnicamente mais qualificados. Porém, em termos de nível de jogo - tanto do ponto de vista da capacidade de proposição das ações quanto de organização -, a equipe de West Yorshire já é uma vencedora. Já estou torcendo para conseguirem uma boa posição na classificação - quem sabe na primeira metade da tabela? Seja onde for, que seja jogando bola da forma como vem jogando. Essa é a maior conquista em qualquer modalidade esportiva - encantar.

Foto: Reuters

domingo, 23 de agosto de 2020

Num Mundo Que Chora Mortes Na Pandemia, Bayern É Incontestável Campeão Continental

Manuel Neuer levanta a taça: o Bayern de Munique é pela sexta vez o campeão europeu. Foto: Reuters/Matthew Childs/Pool.
 

É um mundo diferente daquele de menos de um ano atrás. E uma rápida olhada para a Liga dos Campeões da Europa ajuda a ter a noção do quanto as coisas se modificaram em questão de meses.

Olhe para o estádio que sediou a final do maior torneio de clubes europeus de futebol: ninguém nas arquibancadas. Felizmente, ninguém nas arquibancadas, pois se houvesse aglomeração, seria uma gigantesca negligência em tempos de pandemia viral.

O coronavírus (SARS-CoV-2 ou COVID-19) foi, sem nenhuma dúvida, o elemento que mais marcou essa edição da UEFA Champions League. Há quem diga (inclusive infectologistas) que o confronto entre Atalanta e Valência, na cidade italiana de Milão, em 19.02.2020, foi uma bomba viral. Explica-se: a Itália vinha somando muitos casos de infecção e morte no norte do país e, com o deslocamento de dezenas de milhares de torcedores desde a cidade de Bérgamo (cidade sede da Atalanta) até Milão (local do jogo), é bastante provável que naquele momento estava sendo levado o coronavírus para uma nova região do país. As semanas que sucederam o jogo deram a dimensão da tragédia, com a Itália se tornando o epicentro europeu de contágios e mortes. Cenário que veio a atingir, também, a Espanha, país onde ocorreu o jogo de volta entre aquelas duas equipes: a Atalanta venceu novamente e celebrou a classificação (sabe-se lá espalhando quantas gotículas carregadas de vírus entre os dois países)...

Mas, evidentemente, não há que se responsabilizar um único confronto futebolístico pela enormidade das mazelas. Os maiores responsáveis pelos danos causados são os chefes de governo que fazem pouco caso do isolamento social. São aqueles que bradam que "a economia não pode parar" (como se o capital tivesse vida e a vida fosse desprovida de qualquer sentimento). Enfim, aqueles que sobreviveram, puderam assistir o Bayern de Munique campeão europeu pela sexta vez em sua história. Um título que é esvaziado pelo momento de dor que vive a humanidade (somente mentes de psicopatas podem achar que este ano de dois mil e vinte é como outro qualquer). Mas, ainda assim, há que se dizer: parabéns ao Bayern pela espetacular campanha na competição, tendo vencido todas as partidas disputadas - antes e durante o coronavírus. Foram 43 gols em 11 jogos. E uma atuação maiúscula na final, quando superou a qualificada equipe do Paris Saint-Germain por 1a0, gol de Coman (que é cria do PSG), e com grandes atuações de Neuer e Thiago Alcântara. Ainda assim, certamente, a partida que mais será lembrada nessa trajetória épica terá sido a implacável goleada de 8a2 sobre o Barcelona, na fase de quartas de final, nove dias antes de levantar o troféu, também em Lisboa, também com portões fechados ao público.

Que a festa esportiva seja feita com responsabilidade na Alemanha e em qualquer lugar. Há, nesse momento, famílias em luto. Pessoas que trocariam o êxito do seu time por simplesmente poder voltar ao convívio de seus entes queridos. Vidas que economia nenhuma poderá trazer de volta.