Foto: Juan Mabromata / AFP |
André Schürrle, outro jovem jogador que começou a final no banco, fez linda jogada pelo lado esquerdo. E quando digo "linda jogada" estou me referindo sobretudo ao grau de sucesso levando em consideração o nível de dificuldade da coisa. Schürrle conseguiu, diante da marcação dupla dos gigantes Pablo Zabaleta e Javier Mascherano, acionar Götze num espaço entre outra dupla de gigantes - Martín Demichelis e Ezequiel Garay. Era tudo o que Gott (o Deus) precisava para encaminhar o tetra: Götze (o jogador) em liberdade na área argentina. Uma liberdade condicional, pois logo chegaria o goleiro Sergio Romero para fazer a cobertura. Mas Götze não precisava de nada mais do que o talento que Gott lhe deu: dominou no peito já arrumando para a finalização e completou com a perna esquerda sem sequer deixar a bola encostar na grama. Porque lugar de bola é na rede. Estava feito o gol histórico.
Imagem extraída de DiárioDoPoder. |
Após jogada de Schürrle pela esquerda, Götze conclui na pequena área: Alemanha 1a0 Argentina, em momento que será lembrado por gerações.
Não há complexidade de uma final de Copa que caiba em dois parágrafos. E esse texto não ousa comportar em suas humildes linhas todas as variáveis que compuseram tão espetacular decisão de campeonato. O jogo teve um pouco de muita coisa. Um tanto de pouca coisa. E teve algo que não poderia faltar: futebol. Ah, o futebol! Que bênção dos deuses essa final! Reuniu uma seleção com impressionante capacidade de circular a bola com qualidade e outra com incrível aplicação para confrontar de igual para igual um adversário teoricamente superior. A Argentina mostrou-se poderosa. E seu poder estava em algo que não se mede e, se não pode ser medido, também não pode ser contido: a determinação. Determinação desde uma linha de defesa intransponível no seu posicionamento milimétrico até uma linha de ataque ousada em cada tentativa de infiltrar na zaga oponente. Sem esquecer da alma: o meio-campo. Uma alma materializada na camisa catorze de Mascherano. A Alemanha encontrou um adversário à altura. E aqui vão os elogios àquele indivíduo diretamente responsável pela eficiência de cada setor da equipe: o técnico Alejandro Sabella. Conseguiu a proeza de montar a Albiceleste sem criar uma dependência exclusiva do gênio Lionel Messi. Só que se a Argentina, taticamente, era muito mais do que Messi + dez, na prática, os argentinos bem que gostariam de ter um "segundo Messi" no gramado. Poderia ser Ángel di María, que jogou demais nas oitavas (infelizmente ausente na final por contusão). Poderia ser Sergio Agüero, jogador de enorme potencial mas que não fez uma boa Copa (também teve problemas com lesão, só entrando no intervalo na decisão). No primeiro tempo, Ezequiel Lavezzi foi talvez o maior parceiro de Messi. Correndo barbaridade tanto para contra-atacar quanto para recompôr a marcação, o jogador foi um dos destaques nos primeiros quarenta e cinco minutos. Daí meu não entendimento por substituí-lo por Agüero no intervalo. Opção tática ou necessidade clínica? De toda forma, uma alteração corajosa. Alteração de quem tinha mais forte em si o sonho de ganhar o jogo do que o medo de perdê-lo.
A Argentina perdeu muito em combatividade no meio-campo, mas jamais perdeu a consistência. Marcos Rojo, Lucas Biglia e Enzo Pérez se desdobraram para manterem o equilíbrio tático diante da alta rotatividade alemã. Ofensivamente, a Argentina seguia perigosíssima. Esbarrava na excepcional atuação de Jérôme Boateng (era aquilo um zagueiro ou o Muro de Berlim em pleno Rio de Janeiro?). E encaixavam-se as peças de um quebra-cabeça: não foi a Bélgica que tremeu nas quartas, nem a Holanda que teve desempenho pior na semi, tampouco a Alemanha piorou na final. Em todos esses três eventos, foi a Argentina que mostrou-se superior a ponto de inibir qualidades de três grandes adversários.
Para aumentar ainda mais as esperanças no tri, a Argentina tinha Messi com mais uma grande atuação. Passava por Hummels como queria. Invertia o jogo com facilidade. No início do segundo tempo, fez linda jogada individual e finalizou raspando a trave. Era Messi sendo Messi! Tipo o papa rezando a missa! Não importa para que seleção você torça nem que religião você siga, há que se reconhecer o talento onde existe o talento. E Lionel é daqueles para tirarmos o chapéu. Por falta de sorte da Argentina, ele não teve aquela chance de gol frontal que tivera Higuaín. Nem cairia nos pés dele a bola do jogo: na prorrogação, Rodrigo Palacio (que entrou no lugar de Higuaín) recebeu em ótima condição, dominou como manda o figurino e encobriu Manuel Neuer, só que sem conseguir completar/direcionar pro gol.
Foto: Jamie Squire / Getty Images |
Rodrigo Palacio tem a bola do jogo na prorrogação: argentino escolheu encobrir o goleiro Neuer e a bola acabou saindo ao lado da trave.
O que a Argentina não conseguiu com Higuaín nem com Palacio, a Alemanha aproveitou com Götze. Está descrito no segundo parágrafo. Estava escrito nas estrelas. Mais precisamente naquela estrela que se junta às outras três, logo acima do escudo alemão. Uma Alemanha que se reinventou com Löw. Que revolucionou sua própria maneira de jogar futebol. Que iniciou o caminho do tetra com um 4a0. E que, desde muito antes de sua ótima passagem pelo Brasil (tanto dentro de campo com uma performance de alto nível quanto fora dele com ótimas relações com a população), mostrava trilhar a direção correta (leia aqui). Parabéns a essa brilhante geração e a esse magnífico técnico de futebol. Diante de todas essas qualidades notáveis na Alemanha e da realidade que foi a final, não resta mais nada senão dar os parabéns, também, à Argentina. Não foi derrotada. Venceu junto com o futebol. E tem todo o direito de sonhar com sua terceira estrela daqui a quatro anos, em Moscou.
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