Com menos de cinco minutos de jogo, sangue. Era o primeiro ingrediente de que estávamos diante de algo marcante no jogo entre argelinos e russos. O camisa dez da Argélia, apontado como maior craque dessa seleção, sofreu um corte na cabeça e foi orientado pelo árbitro turco Cuneyt Çakir a deixar o campo de jogo. Enquanto Sofiane Feghouli era atendido na beirada de fora da lateral, Dmitri Kombarov aproveitou o espaço pelo flanco esquerdo (setor que era e seria vigiado pelo próprio Feghouli) e descolou cruzamento certeiro para Aleksandr Kokorin, que cabeceou esbanjando competência para tirar qualquer chance de intervenção do goleiro M'Bolhi. 1a0 Rússia.
Disciplinada taticamente e consciente do que deveria fazer com e sem a bola, a Rússia de Fabio Capello preenchia o gramado paranaense com o tom vinho de um dos mais belos uniformes confeccionados para essa Copa. A defesa dialogava com o meio, que dialogava com o ataque, que parecia ser o início da defesa. Um sistema retroalimentado, que avançava e recuava como que obedecendo os rigores de um quartel. Quase como uma marcha. A meta: a classificação. Eram os "soldados" do "general" Capello mostrando foco total no objetivo traçado.
Feghouli precisou sair novamente para estancar o sangramento que teimava em escorrer pelo rosto, gerando desespero nele próprio e no treinador Vahid Halihodzic, possivelmente traumatizados com o gol que aconteceu precisamente quando o jogador recebia atendimento. O confronto tático apontava equilíbrio no meio-campo, com Feghouli encarando Kombarov e Faizulin por um lado enquanto Djabou tinha pela frente a resistência de Glushakov e Kozlov. Tudo ficava menos complicado para a seleção africana quando os laterais Mandi e Mesbah apoiavam, mas era na habilidade de Brahimi que a Argélia esboçava maior poder de infiltração. Esboçava sem poder se dar ao luxo de se expôr, pois os russos tinham em Samedov e Shatov constantes ameaças nos contra-ataques, sempre procurando acionar Kokorin e Kerzhakov.
Mutuamente anuladas num dinamismo típico dos bons jogos, o placar de um a zero para os europeus se manteve até o intervalo. E a Rússia voltou com uma modificação para o segundo tempo: Glushakov por Denisov, substituição que Capello realizara na estréia e que, depois dela, a equipe conseguiu o gol de empate diante dos sul-coreanos. Só que dessa vez era um outro adversário e uma outra situação. Embalados pelas arquibancadas que não cessavam em apoiar a equipe, a Argélia teve num lance de bola parada pelo lado esquerdo a chance de empatar. Luz verde proveniente de algum objeto que não deveria estar no estádio foi direcionada para o rosto do goleiro Akinfeev. Bola levantada na área por Brahimi. O goleiro sai, não alcança a bola e quem cabeceia é Slimani. Slimani havia mostrado qualidade no jogo aéreo, tendo levado a melhor pelo menos duas vezes em lances anteriores. Dessa vez, não somente levou a melhor como conseguiu cabecear na rede. 1a1, retomada do segundo lugar e uma festa incrível no estádio, aos catorze minutos no segundo tempo.
Precisando de um novo gol, Capello recorreu a um de seus jogadores mais talentosos e colocou Dzagoev no lugar de Shatov. Halihodzic respondeu trocando Brahimi por Yebda, dando mais vigor físico ao meio-campo. Mas tarde foi a vez de Ghillas e seu penteado exótico entrarem no lugar de Djabou. A Rússia até conseguia algumas jogadas de aproximação, mas não com o volume e a intensidade que se espera de quem precisa quase que desesperadamente do resultado. Kanunnikov ainda entrou no lugar de Kerzhakov, na última cartada para tentar mudar o destino do jogo.
O goleiro M'Bolhi precisou agir para evitar o gol russo, e agiu bem, em mais uma boa atuação do camisa vinte e três argelino. Em uma escapada da equipe do norte da África, o arqueiro Akinfeev foi quem evitou a virada. Nos acréscimos, Slimani, autor do gol, deu lugar para Soudani. As câmeras já mesclavam a filmagem entre o campo de jogo, o banco de reservas argelino e a torcida. A emoção atravessava a televisão. A reação de Halihodzic sinalizando que o final estava próximo com um misto de alegria, empolgação e ansiedade foi algo difícil de narrar. Veio o apito final e com ele a consumação do fato histórico: pela primeira vez desde sempre, a Argélia avança para as oitavas-de-final numa edição de Copa do Mundo. Curitiba nunca foi tão verde.
Elenco argelino dá volta olímpica com a bandeira do país em Curitiba: torcedores brasileiros também foram ao delírio com o contagiante desempenho dos comandados de Halihodzic.
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