Quando alguém te pergunta o nome de um filme que você tenha gostado muito de assistir (aquele pra figurar no topo na lista de preferências), o que você responde? Bem, provavelmente, independentemente do nome da película, a resposta será em referência a alguma obra cinematográfica que tenha final emocionante. Pode ser suspense, drama, aventura. Mas, preferencialmente, com final emocionante. Às vezes o filme nem chega a ser primoroso em seu roteiro ou não tenha uma atuação inesquecível por parte de alguém do elenco. Mas, sendo o final emocionante, tudo muda de figura.
Holanda e México não fizeram um grande jogo no Castelão. Sol forte, horário ingrato, umidade alta, tudo parecia conspirar para uma partida arrastada em Fortaleza. Até a torcida fugiu das áreas iluminadas pelo astro-rei, deixando um clarão nas arquibancadas e procurando abrigo à sombra. Os jogadores não têm essas regalias. Pelo contrário. Uma bola lançada para Robin van Persie não foi dominada da maneira ideal pelo camisa nove muito provavelmente por causa do sol na cara do holandês. Uma marcação implacável. A pausa para reidratação era o mínimo do mínimo que poderia ser feito pelos atletas. Mesmo assim, é lamentável que nos sujeitemos a jogos em horários como esse. Atuar à uma da tarde no nordeste brasileiro é mais grave do que muita mordida no ombro.
Os primeiros vinte minutos foram no ritmo imposto pelo México. Posse de bola entre as duas intermediárias com cada vez mais aproximação da área holandesa. Já com oito minutos, Nigel de Jong deixou o campo por motivos clínicos - Bruno Martins Indi entrou em seu lugar. Uma mudança de nomes para diversas mudanças de posicionamento: Wijnaldum passou a ficar mais centralizado (na função então exercida por De Jong), Blind migrou uma linha à frente (ocupando a posição anterior de Wijnaldum) e Martins Indi foi fazer a lado esquerdo da defesa (onde estava Blind anteriormente). Na dinâmica da partida, pouca coisa mudou do antes para o depois: México com a bola, Holanda correndo atrás.
Curiosamente, os mexicanos atuavam espalhados pelo campo. A alma do time estava no trio formado por Herrera, Salcido e Guardado, que ditava o compasso e tinha a missão de acionar Giovani dos Santos e Peralta. A liderança técnica e psicológica de Rafa Márquez na linha de cinco defensores era a segurança que o México precisava para conter os contra-ataques holandeses, que só ofereciam perigo quando passavam pelos pés de Arjen Robben. Se bem que Van Persie ainda descolou uma ou duas finalizações. Mas foi só. O primeiro tempo foi do sol, do calor e do México, talvez nessa mesma ordem.
No segundo tempo, o gol mexicano veio ligeiro: Giovani dos Santos acompanhou a trajetória da bola e, mesmo vigiado de perto por Blind e com a marcação dobrada, conseguiu chutar no canto esquerdo de Cillessen, abrindo o placar no Ceará. 1a0 e festa da maior parte da torcida presente no estádio.
A Holanda precisaria achar uma nova maneira de jogar. E achou. Com Memphis no lugar de Verhaegh, Louis van Gaal redesenhou a formação tática da equipe: de quatro para três defensores; três meio-campistas; e Memphis aberto pelo flanco esquerdo, possibilitando que Robben ficasse mais dedicado ao lado direito, com Kuyt se deslocando pelos dois extremos.
Se Miguel Ernesto Herrera havia mexido no intervalo por motivo de contusão (Reyes entrou no lugar de Moreno), aos quinze o treinador mexicano substituiu para promover uma mudança estratégica: saiu o autor do gol Giovani dos Santos e entrou o meio-campista Aquino. Uma opção que chamou ainda mais os holandeses para o campo do México. Percebendo o tamanho do perigo e tentando não perder completamente a possibilidade de contra-atacar, Herrera colocou Javier Hernández no lugar de Peralta. Ganhou velocidade, mas não tinha conexão do resto do time com Chicharito.
Van Gaal fez sua última modificação imediatamente depois, trazendo Huntelaar para o lugar de Van Persie. E aqui, aos trinta minutos no segundo tempo, foi dada oportunidade para cornetarmos o consagrado técnico. Senhor treinador, concordamos plenamente que Van Persie não está bem no jogo. E se não está bem é, basicamente, porque não está participando o suficiente para manifestar o seu reconhecido talento. Sneijder recuou para buscar jogo, isolando o atacante. Memphis não vem rendendo aberto pelo lado esquerdo. Blind e Wijnaldum pouco acrescentam na articulação. Apenas Robben representa real ameaça aos adversários. Não seria melhor, caro treinador, mexer em algum elemento mais recuado e trazer alguém que eventualmente pudesse fazer Van Persie aparecer mais?
Mas a cagada, digo, a substituição estava feita. Com determinação e apostando alto em Robben, a Holanda foi criando chances em cima da bem postada defesa do México. Houve um pênalti claro que foi negado à Laranja, em lance onde Robben foi atingido duas vezes, por dois marcadores diferentes - ambos dentro da área. O português Pedro Proença nada assinalara. Como se não bastasse enfrentar sol, calor, umidade elevada e uma arbitragem errante, a Holanda também enfrentava uma zaga liderada por Rafa Márquez e uma baliza protegida por Guillermo Ochoa. Que missão ingrata virar esse jogo!
Foi então que, aos quarenta e dois minutos no segundo tempo no quarto jogo holandês no Mundial, Wesley Sneijder mostrou um pouco do que é, ou melhor, de quem é Wesley Sneijder. Após cobrança de escanteio pelo lado esquerdo, a sobra de bola ficou para o camisa dez holandês, que pegou do jeito que veio para marcar belíssimo gol, não dando sequer oportunidade de reação para Ochoa. Era o empate no Castelão!
Por gols, substituições e reidratação, foram indicados seis minutos como acréscimo. Ou seja, tudo levava a crer que teríamos pela frente uns trinta e seis minutos de futebol praticado no limite da resistência física (já incluindo os dois tempos de quinze minutos de prorrogação). Só que a Holanda queria mais. Ou seja, queria menos tempo de jogo. E era o time com mais jogadores voltados para buscar o gol: enquanto o México era quase que exclusivamente Chicharito no campo ofensivo, os holandeses contavam naquele momento com Sneijder, Kuyt, Robben, Memphis e Huntelaar. E, para confirmar a ótima Copa que vem fazendo, Robben arrancou pelo lado direito, fez um carnaval fora de época na defesa mexicana e caiu ao ter o pé de Rafa Márquez colocado à sua frente. Dessa vez, Pedro Proença assinalou a penalidade máxima, para desespero da seleção que talvez tenha pensado que pênaltis só existiriam se fosse para a série derradeira de desempate.
Lembram da cornetada que tivemos a oportunidade de dar em Van Gaal por ter trocado Van Persie por Huntelaar? Pois bem: aos quarenta e oito, o próprio Huntelaar pegou a bola, colocou na marca e cobrou com categoria, com Ochoa caindo no canto oposto na fotografia. Virada holandesa. Virada laranja. Uma seleção que mostrou que é casca grossa. Que não azeda por qualquer coisinha. E que chega fortíssima na fase quartas-de-final. 100% saborosa. Não é cebola, mas proporcionou lágrimas nos olhos dos mexicanos. E, tal qual filmes que ficam na memória da gente, o jogo no Castelão também merece ser lembrado.
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